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quarta-feira, 25 de março de 2009

trovadorismo

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TROVADORISMO

O Trovadorismo foi a primeira escola literária portuguesa. Esse movimento literário compreende o período que vai, aproximadamente do século XII ao século XIV.
A partir desse século, Portugal começava a afirmar-se como reino independente, embora ainda mantivesse laços econômicos, sociais e culturais com o restante da Península Ibérica. Desses laços surgiu, próximo à Galícia (região ao norte do rio Douro), uma língua particular, de traços próprios, chamada galego-português. A produção literária dessa época foi feita nesta variação lingüística.
A cultura trovadoresca refletia bem o panorama histórico desse período: as Cruzadas, a luta contra os mouros, o feudalismo, o poder espiritual do clero.
O período histórico em que surgiu o Trovadorismo foi marcado por um sistema econômico e político chamado Feudalismo, que consistia numa hierarquia rígida entre senhores: um deles, o suserano, fazia a concessão de uma terra (feudo) a outro indivíduo, o vassalo. O suserano, no regime feudal, prometia proteção ao vassalo como recompensa por certos serviços prestados.
Essa relação de dependência entre suserano e vassalo era chamada de vassalagem.
Assim, o senhor feudal ou suserano era quem detinha o poder, fazendo a concessão de uma porção de terra a um vassalo, encarregado de cultivá-la.
Além da nobreza (classe que pertenciam os suseranos) e a classe dos vassalos ou servos, havia ainda uma outra classe social: o clero. Nessa época, o poder da Igreja era bastante forte, visto que o clero possuía grandes extensões de terras, além de dedicar-se também à política.
Os conventos eram verdadeiros centros difusores da cultura medieval, pois era neles que se escolhiam os textos filosóficos a serem divulgados, em função da moral cristã.
A religiosidade foi um aspecto marcante da cultura medieval portuguesa. A vida do povo lusitano estava voltada para os valores espirituais e a salvação da alma. Nessa época, eram freqüentes as procissões, além das próprias Cruzadas - expedições realizadas durante a Idade Média, que tinham como principal objetivo a libertação dos lugares santos, situados na Palestina e venerados pelos cristãos. Essa época foi caracterizada por uma visão teocêntrica (Deus como o centro do Universo). Até mesmo as artes tiveram como tema motivos religiosos. Tanto a pintura quanto a escultura procuravam retratar cenas da vida de santos ou episódios bíblicos.
Quanto à arquitetura, o estilo gótico é o que predominava, através da construção de catedrais enormes e imponentes, projetadas para o alto, à semelhança de mãos em prece entanto tocar o céu.
Na literatura, desenvolveu-se em Portugal um movimento poético chamado Trovadorismo. Os poemas produzidos nessa época eram feitos para serem cantados por poetas e músicos. (Trovadores - poetas que compunham a letra e a música de canções. Em geral uma pessoa culta - Menestréis - músicos-poetas sedentários; viviam na casa de um fidalgo, enquanto o jogral andava de terra em terra - , Jograis - cantores e tangedores ambulantes, geralmente de origem plebéia - e Segréis - trovadores profissionais, fidalgos desqualificados que iam de corte em corte, acompanhados por um jogral) Recebiam o nome de cantigas, porque eram acompanhados por instrumentos de corda e sopro. Mais tarde, essas cantigas foram reunidas em Cancioneiros: o da Ajuda, o da Biblioteca Nacional e o da Vaticana.

A poesia medieval portuguesa
A produção poética medieval portuguesa pode ser agrupada em dois gêneros:
I - O gênero lírico: em que o amor é a temática constante, são as cantigas de amor e as cantigas de amigo.
A canção da Ribeirinha
Esta cantiga de Paio Soares de Taveirós é considerada o mais antigo texto escrito em galego-português: 1189 ou 1198, portanto fins do século XII. Segundo consta, esta cantiga teria sido inspirada por D. Maria Pais Ribeiro, a Ribeirinha, mulher muito cobiçada e que se tornou amante de D. Sancho, o segundo rei de Portugal.
"No mundo nom me sei parelha,
mentre me for' como me vai,
ca ja moiro por vos - e ai
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi em saia!
Mao dia que me levantei,
que vos enton nom vi fea! "

E, mia senhor, des aquel di' , ai!
me foi a mim mui mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e ben vos semelha
d'haver eu por vós guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vós houve nem hei
valia d'ua correa".

I.1.Cantigas de amor
Nesta cantiga o eu-lírico é masculino e o autor é geralmente de boa condição social. É uma cantiga mais "palaciana", desenvolve-se em cortes e palácios.
Quanto à temática, o amor é a fonte eterna, devendo ser leal, embora inatingível e sem recompensa. O amante deve ser submetido à dama, numa vassalagem humilde e paciente, honrando-a com fidelidade, sempre (Cá entre nós, a época que os homens ainda eram inteligentes.
O nome da mulher amada vem oculto por força das regras de mesura (boa educação extrema) ou para não comprometê-la (geralmente, nas cantigas de amor o eu-lírico é um amante de uma classe social inferior à da dama).
A beleza da dama enlouquece o trovador e a falta de correspondência gera a perda do apetite, a insônia e o tormento de amor. Além disso, a coita amorosa (dor de amor) pode fazer enlouquecer e mesmo matar o enamorado.
Meus olhos (título adap).
Estes meus olhos nunca perderan,
senhor, gran coyta
mentr' eu vivo fôr;
e direy-vos, fremosa mia senhor,
d'estes meus olhos a coyta que an:
choran e cegan, quand' alguen que veen.

Guisado teen de nunca perder
meus olhos coyta e meu coraçon,
e estas coytas, senhos, mias son;
mays los meus olhos, por alguen veer,
choran e cegan, quand' alguen non veen,
e ora cegan por alguen que veen.

E nunca ja poderey aver ben,
poys que amor já non quer nem quer Deus;
mays os cativos d'estes olhos meus
morrerán e cegan, quand' alguen non veen,
e ora cegan por alguen que veen.

(Gran coyta: grande paixão desgosto. / Fremosa mia senhor: minha bela senhora)

I.2. Cantigas de amigo
As cantigas de amigo apresentam eu-lírico feminino, embora o autor seja um homem.
Procuram mostrar a mulher dialogando com sua mãe, com uma amiga ou com a natureza, sempre preocupada com seu amigo (namorado). Ou ainda, o amigo é o destinatário do texto, como se a mulher desejasse fazer-lhe confidências de seu amor. (Mas nunca diretamente a ele. O texto é dialogado com a natureza, como se o namorado estivesse por perto, a ouvir as juras de amor). Geralmente destinam-se ao canto e a dança.
A linguagem, comparando-se às cantigas de amor é mais simples e menos musical pois as cantigas de amigo não se ambientam em palácios e sim em lugares mais simples e cotidianos.
Conforme a maneira como o assunto é tratado, e conforme o cenário onde se dá o encontro amoroso, as cantigas de amigo recebem denominações especiais
a)Alvas (quando se passam ao amanhecer):
Levantou-s'a velida (a bela)
Levantou-s'à alva;
e vai lavar camisas e no alto (no rio)
vai-las lavar à alva (de madrugada). - D. Dinis.
b)Bailias (quando seu cenário é uma festa onde se dança):
E no sagrado (local sagrado, possivelmente à frente de uma igreja), em Vigo
bailava corpo velido (uma linda moça) amor ei! - Martim Codax.
c)Romarias (sobre visitas a santuários, enquanto as "madres queymam candeas"):
Pois nossas madres van a San Simon
de Val de Prados candeas queimar (pagar promessas)
nós, as menininhas, punhemos d'andar (vamos passear). - Pero de Viviães.
d)Barcarolas ou Marinhas (falam do temor de que o "amigo" vá às expedições marítimas; do perigo de que ele não volte mais.
Vi eu, mia madr' , andar
as barcas e no mar,
e moiro de amor! - Nuno Fernandes Torneol
e)Pastorelas (quando seu cenário é o campo, próximo a rebanhos):
Oi (ouvi) oj'eu ua pastor andar,
du (onde) cavalgava per ua ribeira,
e o pastor estava i senlheira, (sozinha)
a ascondi-me pola escuitar... - Airas Nunes de Santiago.
II.Gênero satírico: em que o objetivo é criticar alguém, ridicularizando esta pessoa de forma sutil ou grosseira; a este gênero pertencem as cantigas de escárnio e as cantigas de maldizer.
São composições que expressam melhor a psicologia do tempo, onde vêm á tona assuntos que despertam grandes comentários na época, nas relações sociais dos trovadores; são sátiras que atingem a vida social e política da época, sempre num tom de irreverência; são sátiras de grande riqueza, uma vez que se apresentam num considerável vocabulário, observando-se, muitas vezes o uso de trocadilhos; fogem às normas rígidas das cantigas de amor e oferecem novos recursos poéticos.
Os principais temas das cantigas satíricas são: a fuga dos cavaleiros da guerra, traições, as chacotas e deboches, escândalos das amas e tecedeiras, pederastia (homossexualismo) e pedofilia (relações sexuais com crianças), adultério e amores interesseiros e ilícitos.
Obs: Tanto nas cantigas de escárnio quanto nas de maldizer, pode ocorrer diálogo. Quando isso acontece, a cantiga é denominada tensão (ou tenção). Pode mostrar a conversa entre a mãe a moça, uma moça e uma amiga, a moça e a natureza, ou ainda, a discussão entre um trovador e um jogral, ambos tentando provar que são mais competentes em sua arte.

II.1.Cantigas de Escárnio
Apresentam críticas sutis e bem-humoradas sobre uma pessoa que, sem ter nome citado, é facilmente reconhecível pelos demais elementos da sociedade.
Ai, dona fea, fostes-vos queixar
que vos nunca louv' en [o] meu cantar;
mais ora quero fazer um cantar
en que vos loarei toda via;
e vedes como vos quero loar;
dona fea, velha e sandia!

Dona fea, se Deus me perdon,
pois avedes [a] tan gran coraçon
que vos eu loe, en esta razon
vos quero loar toda via;
e vedes qual será a loaçon
dona fea, velha e sandia!

Dona fea, nunca vos eu loei
en meu trobar, pero muito trobei;
mais ora já un bon cantar farei,
en que vos loarei toda via;
e direi-vos como vos loarei:
dona fea, velha e sandia!

(Loarei: louvarei / Sandia: louca / Avedes tan gran coraçon: tendes tanto desejo / loaçon: louvor)

II.2.Cantigas de Maldizer
Neste tipo de cantiga é feita uma crítica pesada, com intenção de ofender a pessoa ridicularizada. Há o uso de palavras grosseiras (palavrões, inclusive) e cita-se o nome ou o cargo da pessoa sobre quem se faz a sátira:

Maria Peres se mãefestou (confessou)
noutro dia, ca por pecador (pois pecadora)
se sentiu, e log' a Nostro Senhor
prometeu, pelo mal em que andou,
que tevess' um clérig' a seu poder, (um clérigo em seu poder)
polos pecados que lhi faz fazer
o demo, com que x'ela sempr'andou. (O demônio, com quem sempre andou)

Mãefestou-se, ca (porque) diz que s'achou
pecador mui't,(muito pecadora) porém, rogador
foi log' a Deus, ca teve por melhor
de guardar a El ca o que a guardou
E mentre (enquanto) viva diz que quer teer
um clérigo, com que se defender
possa do demo, que sempre guardou

E pois (depois) que bem seus pecados catou
de sa mor' ouv (teve) ela gram pavor
e d'esmolar ouv' ela gram sabor (teve grande prazer em esmolar)
E logo entom um clérico filhou (agarrou )
e deu-lhe a cama em que sol jazer (sozinha dormia)
E diz que o terrá mentre (terá enquanto) viver
e esta fará; todo por Deus filhou. (E isso fará, pois tudo aceitou por Deus).

E pois que s'este preito ( pacto) começou,
antr'eles ambos ouve grand'amor.
Antr'el (entre) á sempr'o demo maior
atá que se Balteira confessou.
Mais pois que viu o clérigo caer,
antre'eles ambos ouv'i (teve nisso) a perder
o demo, dês que (desde que) s'ela confessou.
(adaptado de: http://www.geocities.com/alcalina.geo/39litera/trova.htm)

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